Coisas que me dão na telha, de vez em quando, e que quero deixar registradas, nem que seja num blog.







terça-feira, 27 de setembro de 2011

Para evitar recidivas II

(Continuação de “Para evitar recidivas I”)

SACRIFÍCIO DE ANIMAIS

     Em julho de 2004, o então governador do RS, Germano Rigotto, sancionou projeto de lei acrescentando parágrafo único a um dos artigos do Código Estadual de Proteção aos Animais, com a seguinte redação: “Não se enquadra nessa vedação o livre exercício dos cultos e liturgias das religiões de matriz africana”. A proposta de inclusão do parágrafo foi do então deputado Edson Portilho (PT).
     O Código Estadual de Proteção aos Animais foi instituído pela Lei nº 11.915, de maio de 2003.
     Na ocasião, foi geral a gritaria dos defensores dos animais. Saltaram abaixo-assinados de tudo quanto foi lado para tentar proibir a inclusão do parágrafo, sob a alegação que assim se estaria permitindo tortura e sacrifício de animais em rituais religiosos. Essas pessoas “politicamente corretas” acabaram fazendo juízes e desembargadores perderem seu tempo, mas não levaram e o texto da lei ficou como sancionado pelo governador.
     Pois bem, como nos exemplos anteriores (leia “Para evitar recidivas I”), gente que passa a vida ouvindo o galo cantar sem saber onde, resolveu “noticiar” o fato como se novo fosse. A “informação” passou dos emaisl ao facebook, com títulos do tipo “Aprovada Lei que permite TORTURA de animais”; “VAMOS COMPARTILHAR! NÃO DEIXE QUE UM ANIMAL COMO ESTE DESTRUA A PRÓPRIA RAÇA!”. Como alguns(as) “amigos(as)” meus publicaram em seus murais a “novidade”, fui atrás do divulgador. Descobri um cara que provocou nada mais nada menos do que 11.507 compartilhamentos, 11.704 comentários e 13.940 pessoas curtiram sua postagem. Se acrescentarmos aí os que compartilharam os compartilhamentos, a que número chegaremos?
     De acordo com o Art. 2º da Lei que instituiu o Código Estadual de Proteção aos Animais, é vedado:

I - ofender ou agredir fisicamente os animais, sujeitando-os a qualquer tipo de experiência capaz de causar sofrimento ou dano, bem como as que criem condições inaceitáveis de existência;
II - manter animais em local completamente desprovido de asseio ou que lhes impeçam a movimentação, o descanso ou os privem de ar e luminosidade;
III - obrigar animais a trabalhos exorbitantes ou que ultrapassem sua força;
IV - não dar morte rápida e indolor a todo animal cujo extermínio seja necessário para consumo;
V - exercer a venda ambulante de animais para menores desacompanhados por responsável legal;
VI - enclausurar animais com outros que os molestem ou aterrorizem;
VII - sacrificar animais com venenos ou outros métodos não preconizados pela Organização Mundial da Saúde - OMS -, nos programas de profilaxia da raiva.

Parágrafo único - Não se enquadra nessa vedação o livre exercício dos cultos e liturgias das religiões de matriz africana. (Incluído pela Lei n° 12.131/04)

     Ocorre que na mesma ocasião em que o governador sancionou Lei 12.131, também assinou o Decreto nº 43.252, que em seu Art. 2º diz que “Para o exercício de cultos religiosos, cuja liturgia provém de religiões de matriz africana, somente poderão ser utilizados animais destinados à alimentação humana, sem utilização de recursos de crueldade para a sua morte.”
     Ora, por acaso os fiéis do candomblé e da umbanda transgridem alguma das alíneas do código? Se acharem que sim, sugiro aos fundamentalistas defensores que pesquisem sobre crueldade em aviários.
     Percebe-se, então, que desde maio de 2003 — ou seja, há oito anos — além de ofender por emails ou por redes sociais o ex-deputado Edson Portilho, alguns vêm exacerbando seu preconceito contra religiões de matriz africana, mais uma vez ouvindo o galo cantar sem saber onde.
     As pessoas têm medo do que não conhecem, e fantasiam demasiadamente sobre o desconhecido, passando tabus e preconceitos de geração em geração. Muitos associam as religiões de matriz africana ao mal. Imaginam que os animais são “cruelmente torturados” nos sacrifícios dos seus cultos, aos quais os ignorantes classificam como “bruxaria”. No candomblé e na umbanda o ritual é realizado por uma pessoa especializada no sacrifício, o Axogun, que tem tal função na hierarquia sacerdotal ou, na sua falta, o babalorixá. O Axogun NÃO PODE DEIXAR O ANIMAL SENTIR DOR OU SOFRER, porque a oferenda não seria aceita pelo Orixá. O objeto do sacrifício, que é sempre um animal, muda conforme o Orixá ao qual é oferecido; trata-se, conforme a terminologia tradicional, ora de um animal de duas patas, ora de um animal de quatro patas, galinha, pombo, bode, carneiro. Na realidade não se trata de um único sacrifício: sempre que se fizer um sacrifício a qualquer Orixá, deve ser antes feito um para Exu, o primeiro a ser servido.
     E, atenção: nenhuma parte do animal é jogada fora! O couro é usado para encourar os atabaques, o animal inteiro é limpo e cortado em partes, algumas partes são preparadas para os Orixás e o restante é destinado aos demais. Tudo é aproveitado: até a porção oferecida aos Orixás é posteriormente distribuída entre os filhos da casa como o inché do Orixá. É usada para confraternização: unem-se os filhos a comer com o pai ou mãe, havendo repartição do Axé gerado pelo Orixá.
(http://pt.wikipedia.org/wiki/Sacrif%C3%ADcio#Sacrif.C3.ADcio_no_Candombl.C3.A9)
     De acordo com o advogado Antonio Basílio Filho (Ogan Basílio de Xangô), vice-presidente do Superior Órgão de Umbanda e Candomblé do Estado de São Paulo e diretor jurídico da União de Tendas de Umbanda e Candomblé do Brasil, em artigo publicado na Revista Orixás Candomblé e Umbanda, Ano II, Nº 6 (Editora Minuano), “o sacrifício dos animais é ritual de consagração, em que apenas o sangue é ofertado às entidades superiores, pois o produto final da carne dos animais abatidos é consumido pelos próprios autores da oferenda ou distribuído a entidades assistenciais e pessoas carentes, servindo a carne de alimento exatamente como a carne bovina, suína ou das aves abatidas em matadouros sem que, entretanto, aqui, na prática religiosa, esteja presente o componente econômico que está presente na atividade daqueles que fazem o abate visando, exclusivamente, o lucro advindo da exploração dos animais.”
(http://www.umbandaemfoco.com.br/modules.php?name=Conteudo&file=index&pa=showpage&pid=128)

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Se você quer saber o que é tortura e crueldade contra animais, clique aqui.

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     Espero, portanto, que pelo menos os leitores dessas duas últimas postagens nunca mais repassem emails falando mal do ex-deputado Edson Portilho (hoje em dia ele é vereador em Sapucaia do Sul) e sua emenda à lei que instituiu o Código Estadual de Proteção aos Animais, bem como parem de tratar o auxílio-reclusão como um ato absurdo do governo petista.
     Evitem recidivas!

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Clique e leia “Para evitar recidivas I

Um comentário:

Claea disse...

Que mundo melhor seria, se tivéssemos sempre um "bom Aldo" para esclarecer!

Esse é o meu Aldo!