Coisas que me dão na telha, de vez em quando, e que quero deixar registradas, nem que seja num blog.







terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Simplesmente Manu

     Era junho de 1979. Há pouco mais de dois anos eu havia saído de um casamento insosso que durara quatro anos, não dera frutos nem produzira lucros. Fazia pouco menos de um ano e meio que já estava noutro e, naquele mês, surgia uma menina na minha vida que a mudaria pra sempre.
     Praticamente recém-casado pela segunda vez e já entrava outra mulher na minha história. E muito mais moça do que eu. Sabia que isso aconteceria mais cedo ou mais tarde. É da natureza. O que fazer? Assumir, claro, com desenfreada paixão. Não resisti àqueles grandes e expressivos olhos, àquela boquinha bem desenhada, àquele narizinho empinado — no bom sentido — e àquela simpatia que contagiava a todos, especialmente a mim.
     Eu havia mudado de cidade. Trabalhava em Porto Alegre, mas estava morando em São Leopoldo. Conhecia-a no fim da tarde de um dos dias mais frios daquele inverno. Justamente num dia em que não tinha ido trabalhar, pois estava no hospital, onde minha mulher havia baixado no dia anterior. Vi-a passar no corredor, com uma enfermeira. O que me chamou a atenção foram os gemidos baixinhos que ela emitia e que me deixaram apreensivo. O que teria acontecido? Curioso, fui atrás, perguntei aqui e ali e descobri que não era nada e, também, que aquela era a Manuela que, a partir desse dia, passou a fazer parte da minha vida.
     Como só trabalhava à tarde, passávamos as manhãs juntos. No começo, por causa do frio, apenas fazia companhia a ela na sua própria casa. Com o fim do inverno, passeávamos por quase toda Independência — ou Rua Grande, como é conhecida —, a rua principal de São Leopoldo. Íamos até a Praça Imigrante, na margem do Rio dos Sinos, e voltávamos. Às vezes parávamos em alguma lancheria para tomar um refrigerante, pois eram quentes aquelas manhãs ensolaradas. Algumas pessoas que cruzavam conosco nas movimentadas manhãs da Rua Grande paravam para elogiar a beleza daquela garota, que nada dizia, apenas sorria. Noutros dias, estendíamos um pano na grama, em frente à casa dela, e ficávamos à sombra, lanchando e vendo o movimento da rua. Quando voltava do trabalho, no fim da tarde, ela me recebia cheia de gracejos e sorrisos, que eu retribuía com muitos abraços e carinhos. Era um sonho. O melhor de tudo é que o surgimento daquela paixão melhorou ainda mais meu casamento, que já era bom.

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     Viemos morar em Porto Alegre. O tempo passou rápido, como sempre. A distância entre nossas idades não aumentara, mas dava a impressão de crescer numa razão logarítmica: enquanto ela amadurecia, eu envelhecia.
     Chegou o dia em que ela passou a preferir divertir-se junto a suas muitas amigas, sair com elas à noite. Claro que eu não fazia parte desse plano. Entendi, conformei-me e, ainda por cima, levava-as e buscava-as nas festas que frequentavam. Lembro-me do despertador me chamando às cinco da madrugada, inclusive no inverno. Eu nem guardava o carro na garagem pra não ter que abri-la. Lá ia eu, todo encasacado, cheio de lã, de boné e tudo, pra Dom Pedro II, pra Goethe, pra Plínio ou pra onde houvesse festa. Entre seis e seis e meia aquele bando invadia meu carro, cada uma a sua vez dizia “oi, tio” e passavam a tagarelar todas ao mesmo tempo. Manuela ia quieta ao meu lado. Eu nem perguntava se ela tinha gostado. Sabia que no fim de semana seguinte a cena se repetiria, portanto, sinal que era bom.

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     Hoje, 32 anos se passaram desde aquele junho de 1979 em que Manuela entrou na minha vida pra despertar em mim um amor diferente, que eu nunca sentira antes. E 32 anos é exatamente a idade de Manuela, ou simplesmente Manu, que nasceu no fim de tarde daquele dia frio, que passou gemendo nos braços da enfermeira desde a sala de cirurgia até a maternidade do hospital, cena que eu, casualmente, presenciei da porta do quarto.
     Em janeiro de 1980, há 32 anos, todo orgulhoso, eu exibia minha filha, Manu, pra quem passasse pela Rua Grande.

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     Hoje, 32 anos depois, não passeamos mais pela Rua Grande nem a levo e busco da balada, mas meu orgulho continua.

4 comentários:

Manu Jung disse...

Pai, se o objetivo era me emocionar, ele foi fielmente cumprido! O orgulho é recíproco, e o amor maior ainda. Obrigada por estar do meu lado nessa trajetória, por retratar parte dela neste texto lindo e por me buscar tantas e tantas madrugadas na rua :) TE AMO! Beijos, Manu

vidacuriosa disse...

Parabéns pela história de vida e pela filha, cujo depoimento acima só corrobora todas as qualidades dela que enumeraste. Felicidade para sempre. O amor é sempre e cada vez mais lindo. Abrs

Clara disse...

Aldo, meu querido!
O amor só é lindo, quando encontramos alguém que nos transforma no melhor que podemos ser. E esse amor pelos filhos, certamente é o unico amor transformador.
Parabéns pelo que és e pela filha linda que tens!

Macfuca disse...

Simplesmente a Manu e Simplesmente o Aldo (melhor Tio Aldo).
Não preciso dizer mais nada, aliás parabéns Manu!

Beijo