Coisas que me dão na telha, de vez em quando, e que quero deixar registradas, nem que seja num blog.







sábado, 24 de outubro de 2009

The Old Stones


     Em 1966, aos 16 anos, embalado pela beatlemania, decidi que queria ser músico. Não sei se pro resto da vida, mas queria tocar numa banda, que, naquela época, se chamava conjunto. Conheci o, Júlio, irmão de uma guria de quem eu gostava, que sabia tocar violão. Sentávamos no cordão da calçada, em frente à casa dela (e dele também) e ficávamos cantando músicas dos Beatles. Sei lá o que dizíamos no nosso inglês de ouvido.
     Para ser igual aos Beatles (olha a pretensão!), no entanto, o conjunto tinha que ser de quatro. Foi então que convidei o Buffalo, um amigo com quem eu passava as tardes na Rua da Praia, e o Português, irmão mais moço de um colega de aula. O Português também sabia tocar violão; o Buffalo sabia tocar o mesmo que eu, ou seja, nada... Como eu tinha uma certa coordenação motora e era o que tinha o maior nariz, resolvi ser o baterista. Ao Buffalo restou o contrabaixo.
     Já na garagem da casa do Júlio, Buffalo começou a aprender com os outros dois alguns acordes para, mais tarde, aventurar-se com o contrabaixo.
     Eu ainda não tinha bateria. Na garagem da casa do Júlio tinha um antiga eletrola (aparelho composto de toca-discos, amplificador e alto-falante, combinados em uma só unidade). Não funcionava mais. Era só um móvel velho. O suporte dos discos estava sem o feltro e funcionava como prato, pois fazia pim-pim ao ser tocado com a baqueta; a tábua de baixo, onde eu batia com o pé direito, tinha um som grave e seco, fazendo som de bumbo; ao lado do prato tinha um pedaço de compensado, meio rachado, que eu usava como caixa da bateria.
     E assim fomos passando as tardes dos sábados. A essa altura eu já namorava a irmã do Júlio.
     Precisávamos, contudo, sair da garagem, mostrar nosso talento para o público, fosse qual fosse (tanto o talento como o público). Mas não podíamos, porque faltava a tal de bateria. O Júlio e o Português já tinham guitarras; o Buffalo já tinha contrabaixo; eu só tinha a velha eletrola, que nem era minha...
     Acreditando no talento do grupo e, especialmente, com pena de mim, dona Nilza, mãe do Júlio e da Vera, conseguiu — não sei como — um arremedo de bateria. O instrumento compunha-se de um tarol e um bumbo de banda marcial, um ton de madeira sem fundo e um prato bem grosso pendurado num suporte preso ao próprio bumbo. Ah, e tinha também pedal de bumbo. Pronto! Estava completo o conjunto The Old Stones!
     E, também não sei como, surgiu o primeiro "contrato": tocar numa festa de escolha da Rainha da Primavera do Chapéu de Sol. Quem não sabe, Chapéu de Sol é um bairro não oficial da zona sul de Porto Alegre. Era tarde de um sábado de outubro e lá fomos nós, de Kombi. Fomos recebidos com pompa e circunstância pelo presidente do clube local. Ele nos acolheu na própria casa, que funcionou como uma espécie de "camarim".
     Chegou a noite e fomos para o clube. Todos os presentes, pessoas dos oito aos 80 anos, nos olhavam com admiração e curiosidade. Deviam estar pensando: "Bah! Um conjunto de cabeludos do centro. Que legal, que pretígio! Uma brasa, mora!"
     Começou o baile. Espichávamos as músicas o máximo que dava. Cada vez aumentávamos mais o espaço entre uma e outra. O leitor deve estar se perguntando o porquê disso. Simples: só tínhamos 13 músicas ensaiadas... O que nos salvou foi o desfile das candidatas e a respectiva escolha, além de uma galinhada oferecida atrás do clube, durante a festa. Retornamos ao baile e, novamente, às 13 músicas do repertório. Entre cada três ou quatro músicas repetíamos O Milionário, grande sucesso dos Incríveis.
     Tem um detalhe que esqueci de contar sobre o Buffalo: apesar de já ter contrabaixo, ainda não sabia tocar todas as músicas e, por isso, baixava o volume do amplificador. Mas, assim como não reclamaram do nosso parco repertório, nem notaram que em metade dele não se ouvia o som do baixo...
     A bateria presenteada por dona Nilza funcionou direitinho por um bom tempo.
     The Old Stones cresceu e ficou conhecido em Porto Alegre e algumas cidades do interior. Durou alguns anos e, depois, cada um seguiu seu rumo, tocando em outros "conjuntos".
     Em 1996, para comemorar os 30 anos de que havíamos tocado pela primeira vez, o Buffalo promoveu um jantar dançante e os Old Stones se reuniram de novo.
     

4 comentários:

Clara disse...

Hoje, a banda é outra, mas tive o privilégio de conhecer alguns "músicos" daquela época. Hoje em dia, sou parceira e a maior fã desse baterista, que além de ser um ótimo músico, encantou também o meu coração. Não é mais um cabeludo, mas a dedicação à música é a mesma e nós estamos aí, carregando uma bateria novinha (e nem reclamo), pois vale cada show!

vera disse...

Oi! E eras tão magro que nem tinhas glúteos salientes. Muito parecido com o Mick Jagger aos 16 anos,as amigas chegavam a te confundir com as fotos dos Rollings que eu tinha em casa! Oh.. doces lembranças..minha mãe, a primeira batera, a eletrola..
Quantas reminiscências aflorando né? Deve ser os sessenta anos...
Parabéns "Aldinho" !! (teu apelido à época)

Anônimo disse...

Adorei o texto!!!
Lembro dos ensaios desta banda ali na tua casa em frente a pracinha!Sábado de tarde a turma se reunia para jogar bola,e, além do ensaio na garagem, lá fora tb rolava um som de violão e vozes....TRIDI!!!Beatles, Paul Simon, Dylan, Mamas and Papas...tanta coisa boa, tanta lembrança boa!
Ainda hoje quando a gente se reúne, a energia é bem bacana!!!!Eta turma bem boa!
Abração!!!!
Isa

Anônimo disse...

Foi em 1967 que conheci o conjunto, na época contratado para abrilhantar as festas da Luluzinha, promovidas pelo "turco" Mussi.Dizia que rodava o interior,???Eram dois conjuntos em cada festa, enquanto um tocava, os músicos do outro, dançavam com as meninas da cidade.O Aldinho era um "pão",Nunca esqueci a roupa maraaavilhoooosa da sua apresentação, calça xadrez de verde e marrom com cós muito baixo,cinto largo e blusa de gola olímpica marrom. Dançamos e trocamos endereços,e o que seguiu, foi uma sequencia de cartas,o que me fazia muito feliz,pois pra mim , menina do interior com 15 anos na época,era estar em sintonia com um legitimo representante do rock.
Aldinho, até alguns anos a minha mãe guardava tuas cartas,acho até que ainda tem, pois tinha pena de jogar fora, pois sempre escrevestes muito bem.
Minha mãe dizia que tinhas uma veia poética