Coisas que me dão na telha, de vez em quando, e que quero deixar registradas, nem que seja num blog.







domingo, 21 de novembro de 2010

Monstrengos tinhosos



     A notícia não é nova. Saiu em todos os jornais e noticiários de rádio e TV. Reproduzo a notícia publicada no Estadão, em 09 de novembro.

CNJ afasta juiz que classificava Lei Maria da Penha como ‘monstrengo tinhoso’

     BRASÍLIA - O juiz Edilson Rumbelsperger Rodrigues, de Sete Lagoas (MG), acusado de machismo no julgamento de processos relacionados à Lei Maria da Penha, foi posto em disponibilidade pelo Conselho Nacional de Justiça por 9 votos a 6. Por pelo menos dois anos, ele ficará afastado do trabalho, recebendo vencimentos proporcionais ao tempo de serviço.
     No caso que levou à abertura do processo, em 2007, o juiz dizia ver “um conjunto de regras diabólicas” e afirmava que “a desgraça humana começou por causa da mulher”. Além disso, o magistrado considerava a Lei Maria da Penha absurda e a classificava como um “monstrengo tinhoso”.
     “Ora, a desgraça humana começou no Éden: por causa da mulher, todos nós sabemos, mas também em virtude da ingenuidade, da tolice e da fragilidade emocional do homem (...) O mundo é masculino! A ideia que temos de Deus é masculina! Jesus foi homem!”, afirmava o juiz em sua decisão. “Para não se ver eventualmente envolvido nas armadilhas dessa lei absurda, o homem terá de se manter tolo, mole, no sentido de se ver na contingência de ter de ceder facilmente às pressões”, acrescentava.
     No julgamento, os conselheiros colocaram em dúvida, além da imparcialidade e cumprimento funcional, a sanidade mental do magistrado. Alguns dos seis conselheiros, que votaram apenas pela censura ao magistrado, propuseram que o juiz fosse submetido a exames de sanidade mental. A decisão do Conselho levou em consideração, mais do que os termos da decisão do juiz, as declarações feitas à imprensa e a divulgação dos argumentos.
     Por conta da decisão do CNJ, depois dos dois anos que ficar afastado, o magistrado terá de provar estar “curado do machismo” ou do suposto desequilíbrio mental. “Esse magistrado não tem equilíbrio, seja pelo preconceito que demonstrou nas suas decisões, seja pelos debates que travou (sobre a Lei Maria da Penha) pela imprensa”, afirmou o conselheiro Felipe Locke. “Lamento muito que um magistrado pense dessa forma do gênero que lhe deu a vida. É lamentável que o magistrado pense dessa forma das mulheres”, acrescentou o conselheiro Marcelo Nobre.
     O vice-presidente do CNJ, ministro Carlos Ayres Britto, afirmou que o juiz, nas suas decisões, incitou o preconceito contra a mulher, o que é vedado pela Constituição. “A decisão toca as raias do fundamentalismo. Foi uma decisão obscurantista”, criticou. “O juiz decidiu de costas para a Constituição”, acrescentou.

(...)

     Vozes, ou melhor, textos repercutiram o fato na internet. Destaco um, a favor do juiz punido, que encontrei num site chamado “textosterona”.

Juiz é suspenso por ser machista

     Não estou sozinho. Descobri que tenho mais um companheiro nessa luta para reestabelecer a ordem mundial. O juiz Edilson Rodrigues, da Comarca de Sete Lagoas (MG), foi suspenso por 2 anos por proferir sentença machista. Em uma sentença dada, em 2007, em processo que tratava de violência contra a mulher, ele utilizou declarações machistas para criticar a Lei Maria da Penha. O juiz afirmou, por exemplo, que “o mundo é masculino e assim deve permanecer”. E também manifestou a mesma posição em seu blog na internet e em entrevistas à imprensa.

     Veja, agora, o que propõe o “textosterona”.

     O Blog Textosterona surgiu com o intuito de quebrar alguns mitos. Dentre os principais, o de que homem também sabe escrever, PORRA! E mulherzinhas machinhas também sabem. Como a maioria das boas ideias surgem em botecos, esta também não poderia ser diferente. Formado por um grupo de amigos altamente suscetíveis à cachaça, transmitiremos um pouco dos assuntos debatidos em meio a total embriaguez. Então, não espere grande coisa, mas espere se identificar bastante com os temas abordados. Se você não se identificar, certamente você não tem uma turma foda ou não bebe. E na boa? Não confiamos em quem não bebe.

     Leia quem são e como se descrevem os espermatozoides autores do “textosterona”:

     Renatto Neves - O mais completo paradoxo perfeito. Sou o protótipo da confusão. Uma mistura sutil de valores que intrigam a todos, inclusive a mim. Dono de opinião e cabeça dura. Ouvido e ombro de várias amigas, o que me rendeu grandes conhecimentos no âmbito feminino, pronto pra ser despejado em caracteres.
Viktor Medeiros - Um jovem com boas intenções. Rá! Pegadinha do malandro. Mas, podem contar comigo farei de você um verdadeiro RESENHA.

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     Até aí morreu Neves. Coisa de guri com sérios problemas emocionais relacionados à homossexualidade. Apenas mais dois “monstrengos tinhosos”. O que considerei mais grave foi a opinião do desembargador Carlos Cini Marchionatti, do Tribunal de Justiça do RS, publicada na coluna In verbis, do Correio do Povo de 21 de novembro (domingo), que reproduzo abaixo.

As mulheres, deusas da beleza e o direito de defesa e de opinião

     Sério acontecimento não está sendo devidamente observado.
     Assisti à recente sessão do Conselho Nacional de Justiça que afastou magistrado mineiro por ter cometido excesso de linguagem preconceituoso à mulher em sentença judicial datada de 2007. Foi ele afastado da jurisdição.
     Após a defesa, o presidente do Conselho Federal da OAB pediu a palavra e pronunciou-se pela punição exemplar.
     Este pronunciamento caracteriza exorbitância em relação às finalidades estatutárias da OAB e grave ofensa ao direito de ampla defesa como garantia fundamental da Constituição da República.
     A defesa é a última a se pronunciar antes do julgamento, e adveio a condenação pela opinião considerada incitação ao preconceito, porque a prova demonstrou a correção pessoal do representado, sua imparcialidade e a admiração dos jurisdicionados.
     Aí está a segunda gravidade, a ênfase do julgamento da opinião ou do excesso de linguagem. Deve-se dizer uma opinião infeliz, desgraçada, incabível numa sentença, uma reles opinião, ainda assim uma opinião.
     O sagrado direito de defesa foi aviltado e o julgamento foi da opinião como preconceito. É isso que a Constituição da República preconiza?
     Poetas dizem que a mulher é obra-prima da criação divina. As mulheres são deusas da beleza e do amor. São opiniões ou sentimentos aplaudidos por muitos, mas não por todos. É a minha opinião, da qual não abro mão, embora não fique falando dela nas minhas sentenças.
     Um exagero? Ainda assim uma opinião, à semelhança da infeliz generalização feita na sentença em relação à mulher.
     Pode o CNJ penalizar quem expressou em sentença opinião sobre a mulher, mesmo que lastimável, fato ocorrido em 2007? Em que medida pode punir, por censura da linguagem ou afastamento da jurisdição? O quanto isso importa para o futuro das opiniões independentes que as sentenças representam? Atinge-se a independência das sentenças que garantem ao povo o seu direito? O juiz estará obrigado a julgar conforme a opinião dominante do CNJ, sob pena de afastamento da jurisdição?
     O acontecimento é grave demais para solução neste pequeno artigo, compreensível na sua essência e finalidade: é um alerta e uma crítica em repúdio à decisão do CNJ ao aviltar o direito de defesa e afastar da jurisdição quem expressou mera opinião, ainda que preconceituosa e censurável, porque o direito de defesa garantido a todos e o de opinião, indispensável às sentenças judiciais, são conquistas da humanidade incorporadas na nossa Constituição da República.

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     Que bonito, ó, senhor deus onipresente e onipotente! Quer dizer que se trata de “mera opinião” asseverar em sentença judicial que “a desgraça humana começou por causa da mulher”, considerar a Lei Maria da Penha absurda e a classificar como um “monstrengo tinhoso” e outros disparates?
     Agora vai a minha opinião: esse senhor deus onipresente e onipotente é mais um “monstrengo tinhoso”!
     E não queira, senhor desembargador, punir-me por essa opinião. O senhor mesmo diz que, apesar de lastimável, exagerada e com excesso de linguagem preconceituosa, uma opinião não pode ser punida. E, veja bem, isto não é uma sentença judicial, mas apenas uma infeliz e desgraçada opinião postada em um obscuro blog.
     O senhor veio de uma mulher, desembargador. Por acaso, tem esposa? Tem filha? O que pensa delas? Qual seria sua opinião se algum juiz fosse penalizado por opiniões contra a lei Afonso Arinos? O que o senhor pensa sobre o Projeto de Lei PLC 122/2006, que aborda as mais variadas manifestações que podem constituir homofobia?


     Desculpe-me, senhor desembargador, mas mantenha suas opiniões na sua roda de amigos, não as publique num jornal dominical.

2 comentários:

Renatto Neves disse...

Olá, tudo bem amigo blogueiro?

Fiquei surpreso de ter minha hipotética opinião pessoal sobre o caso em teu blog. Mas sinceramente, não se deve acreditar em tudo que se lê na internet. Eu e alguns amigos criamos o blog para levar de uma maneira machista e também feminista, vários aspectos do cotidiano. Tenho uma turma imensa de amigos, dentre eles, vários homossexuais, lésbicas, bissexuais. Transmitimos no blog uma imagem machista levada sempre pro lado do bom humor. Sou completamente contra agressões físicas de qualquer natureza, porém uma pitadinha de sacarmo e humor negro é normal diante dos fatos. Não é a melhor forma de combater tal problema, mas não estamos aqui para combater nenhum tipo de problema. A ideia do blog é outra, não devendo se confundir com a opinião pessoal dos autores. Parabéns pelo blog. :)

Aldo Jung disse...

Tá bom, Renato, no entanto, afirmaste: Não estou sozinho. Descobri que tenho mais um companheiro nessa luta para reestabelecer a ordem mundial. Isto não é uma hipótese. Embora pretendas fazer humor, dessa vez, não teve graça. Apenas entendi que pensas como o juiz Edilson e tracei minha hipótese: Renato é tão preconceituoso quanto ele.
Não me queiras mal. Apesar da crítica e do meu sarcasmo, gostei do teu blog, especialmente o leiaute. Agradeço e retribuo os cumprimentos. :)