Coisas que me dão na telha, de vez em quando, e que quero deixar registradas, nem que seja num blog.







quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

A Ashura e o terrorismo ocidental




     Recebi por email um vídeo cujo título, em inglês, é Muslin ceremony in Vienna (Cerimônia muçulmana em Viena). O video começa com algumas fotos. A primeira é de uma estátua dourada de Johann Strauss, de pé, tocando violino, que, realmente, está em Viena. Esta imagem funde-se com a foto de uma igreja que, duvido, seja em Viena. Mais se parece com alguma de Minas Gerais ou da Bahia. Se eu entendesse de estilos arquitetônicos até diria de que época é e onde fica. A próxima imagem é de um quadro de Van Gogh sobre o qual não encontrei qualquer referência e muito menos o que teria a ver com a Áustria e, principalmente, com Viena. A quarta imagem é da torre de um prédio clássico, daquelas com relógio, que também não encontrei ao pesquisar imagens de Viena no Google. Enquanto as imagens aparecem, ao fundo toca Hallelujah, coro final da obra Messiah, de Georg Friedrich Händel, que nasceu na Alemanha e morreu em Londres. Acho que nunca passou por Viena.
     Ao final da apresentação das quatro imagens estáticas, cai a rotação da música de fundo e surge, em letras garrafais, a frase Wake up Europe! (Acorda, Europa!), sobre um fundo preto.
     Então começa o vídeo propriamente dito. Um grupo de homens trajando vestes muçulmanas caminha cantando um tipo de mantra e batendo no peito. A câmera dá um close nas mãos de alguns deles, que empunham espadas apontadas para cima. Abaixo do quadro aparece escrito, durante todo o vídeo, Soon, at your favorite city (Breve, na sua cidade favorita).
     A cena seguinte mostra um desses homens, com uma bata branca, de cabeça raspada, rindo e conversando com outros que estão a sua volta, mas que não aparecem no quadro. Um desses outros põe a mão direita atrás da cabeça do então sorridente personagem principal e o faz abaixá-la. Na mão esquerda segura uma navalha, com a qual começa a dar vigorosas batidas na cabeça do homem de branco. Quando para, o flagelado, sangrando, ergue os braços, assim como fazem os católicos quando rezam o Pai Nosso.
     Logo após aparecem vários closes de crianças, uma inclusive de colo, algumas chorando, já sangrando, com talhos na cabeça.
     A cena seguinte mostra vários homens, com as cabeças e batas brancas ensanguentadas, cantando, segurando espadas, brandindo-as no ar ou batendo com a lateral da lâmina na própria cabeça. Não parecem tristes ou estarem sofrendo.
     A câmera passeia pela audiência, onde aparecem duas mulheres, morenas como qualquer árabe, comendo sorvete e assistindo à cerimônia. Volta para os homens, sempre em close up, e, em câmera lenta, desvanece a imagem em um fade out.
     A frase Soon, at your favorite city fica na tela.
     O vídeo é verdadeiro. A cerimônia é verdadeira. O título é mentira. Afora é imagem de Johann Strauss, nada mais do que ali aparece pode-se dizer que seja em Viena, já que as imagens são de rostos, sem que apareça o cenário ao fundo.
     O vídeo é assustador para cristãos ocidentais que, por óbvio, não viram ou seus professores de história e de religião não lhes contaram direito o episódio das Cruzadas.
     O que o vídeo mostra é uma cerimônia da Ashura, uma data comemorativa dos muçulmanos xiitas.
     Diz a tradição xiita – um dos ramos muçulmanos – que, no ano 680 d.C., Imã Hussein, neto do profeta Maomé e filho de Ali (a figura mais reverenciada do islã xiita), foi assassinado numa cidade onde hoje é o território do Iraque. Durante a Ashura, os xiitas se autoflagelam usando facas, espadas e outros objetos cortantes, além das mãos. A intenção é relembrar os sacrifícios da família do profeta. Os xiitas acreditam que Hussein foi morto em uma batalha contra as forças do que se tornaria o ramo principal do islamismo sunita. Para muitos, a derrota confirmou a existência de uma minoria islâmica xiita e marcou a divisão entre os dois ramos. Os xiitas representam cerca de 15% do mundo muçulmano, enquanto os sunitas seriam 85%.
     Os rituais da Ashura, inclusive com autoflagelação, ocorrem em muitos países muçulmanos, como Irã, Iraque, Paquistão, Líbano, Arábia Saudita, Bahrein e outros. Em Viena só no vídeo.
     O mundo ocidental, especialmente a civilização norte-americana, costuma generalizar, qualificando como terrorista qualquer muçulmano. Se for do ramo xiita, então, já deve estar em Guantanamo.
     Terrorismo, no entanto, é mascarar um vídeo dessa forma. Com certeza, foi feito por algum norte-americano paranóico. O nome do vídeo, “Cerimônia muçulmana em Viena”, as frases “Acorda, Europa” e “Breve na sua cidade favorita” nada mais são do que uma tentativa de assustar os ocidentais, ameaçando-os com o que classifica como terrorismo muçulmano.
     O islamismo está mesmo crescendo. Há uma teoria da conspiração que diz que em 50 anos será a maior religião do mundo em número de fiéis. Essa mesma teoria diz que a taxa de natalidade das mulheres muçulmanas é de 4 para 1 na Europa.
     De minha parte, não me importo, desde que não precise navalhar minha cabeça. Mesmo assim, diz o ditado que “o que é do gosto, regala a vida”. Como tem gosto pra tudo...

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