Coisas que me dão na telha, de vez em quando, e que quero deixar registradas, nem que seja num blog.







sábado, 24 de abril de 2010

Tô brabo com o padre!



     São Jorge é o santo patrono da Inglaterra, Portugal, Geórgia, Catalunha, Lituânia, da cidade de Moscou e, extra-oficialmente, da cidade do Rio de Janeiro (título oficialmente atribuído a São Sebastião), além de ser padroeiro dos escoteiros e do S.C Corinthians Paulista. No dia 23 de Abril comemora-se seu martírio. Ele também é lembrado no dia 3 de novembro, quando, por toda parte, se comemora a recons-trução da igreja dedicada a ele, em Lida (Israel), onde se encontram suas relíquias, erguida a mando do imperador romano Constantino I. Há uma tradição que aponta o ano 303 como ano da sua morte. Apesar de sua história se basear em documentos lendários e apócrifos (decreto gelasiano do século VI), a devoção a São Jorge se espalhou por todo o mundo. A devoção a São Jorge pode ter também suas origens na mitologia nórdica, pela figura de Sigurd, o caçador de dragões.
Fonte: wikipedia .

     Agora uma bronca:

POR QUE OS VIZINHOS DA IGREJA DE SÃO JORGE, NO PARTENON, TÊM QUE SER ACORDADOS ANTES DAS SETE DA MANHÃ COM UM ESTRONDOSO PIPOCAR DE FOGOS NO DIA 23 DE ABRIL?

     Me desculpe, padre Jorlei Erivaldo Santos, vigário da Paróquia São Jorge, será que não dava pra adiar um pouco (pelo menos pra depois das sete horas) a queima de fogos? Ah! E tem mais: será que não dava pra adiantar um pouco a queima de fogos noturna para, no máximo, às 22 horas?

     Talvez no próximo ano, né, seu padre!

Um dia de semana qualquer



     Passava um pouco das seis da manhã quando abri a janela da área de serviço. O céu de outono trazia, de cima para baixo, um azul escuro que ia clareando e se transformava num amarelo alaranjado. Duas ou três estrelas maiores ou mais próximas tinham se esquecido de sair da cena e ainda brilhavam no degradê distante do céu da pátria naquele instante. Um cobertor de morros tapava o sol, que acordava anunciando o fim da madrugada.
     Em primeiro plano, as árvores mais altas e os telhados das casas vizinhas; logo adiante, os grandes edifícios residenciais e os altos prédios da PUC; bem ao fundo, morro acima, uma infinidade de luzes tremeluziam tal qual um exército de velas bruxuleantes batendo em retirada.
     Além dos diferentes trilares de pássaros de diversas espécies ouvia o rugido ainda suave da avenida que despertava, a pouco menos de 200 metros. Aquela mistura de roncos, de automóveis, de ônibus, de caminhões e de motocicletas chegava a mim como o som distante das ondas do mar durante as madrugadas, numa praia qualquer.
     Senti o contato ameno dos pelos da minha gata, que se esfregava nas minhas pernas. Olhei-a e ela emitiu um miado quase inaudível. Depois de um carinho retribuído, enchi seu pote de ração, que ela passou a devorar.
     Enquanto a cafeteira cuspia golfadas de água fervendo sobre o pó do café, e moléculas de leite chacoalhadas pelas micro-ondas do forno se esfregavam freneticamente dentro de uma xícara, eu lia as manchetes do jornal que acabara de pegar sob o capacho, na porta de entrada. Numa sintonia perfeita, cafeteira e forno terminaram suas tarefas ao mesmo tempo. Completei a xícara de leite com um pouco de café e bebi vagarosamente lendo a matéria da capa do jornal.
     Depois de um banho morno que tirou o sarro de sono que ainda estava grudado ao meu corpo, voltei ao quarto. Sem acender a luz e sem fazer barulho, separei a roupa para o dia e vesti-a. Ao sentir o cheiro da colônia que borrifava sobre meu rosto, minha mulher acordou sorrindo, como sempre, e me deu bom dia. Beijei-a e dela me despedi com uma promessa: — Eu vou e volto.
     Na saída do edifício cumprimentei a vizinha, que estava com seu filho pequeno. Já dentro do carro, esperei o portão da grade abrir-se cerimoniosamente enquanto passava a van que levaria o menino pa-ra a escola e tomei o rumo da rua. Pra variar, a primeira sinaleira es-tava fechada. Pelos dois lados da rua passavam crianças e adoles-centes que iam para a escola; homens e mulheres indo até a parada dos ônibus que lhes levariam aos respectivos trabalhos; ônibus, táxis e automóveis seguiam pela avenida levando trabalhadores. O sinal ficou verde e fomos, eu e os outros que se enfileiravam na esquina, alguns para a direita e muitos para a esquerda, pois é pra lá que fica o centro.
     Cinco quilômetros depois, antes de subir ao oitavo andar, fui até o Bar do Antônio tomar um cafezinho. Abre parênteses: esse bar, antes conhecido como o Bar da Filô (filosofia), existe desde os anos de chumbo e é onde intelectuais e acadêmicos se reuniam pra falar mal do governo militar. Grande parte deles foi expulsa dos quadros da UFRGS, simplesmente por não pensar como o governo da época queria que se pensasse. Naquele tempo não se podia falar mal do governo, mas ali se podia fumar e tomar cerveja, coisas hoje proibidas. O Bar do Antônio é, dos tantos do campus central da UFRGS, o mais famoso. Fecha parênteses.
     No seu interior as pessoas de sempre: o homem que lê o jornal e marca frases com uma caneta; o chefe dos seguranças; o segurança da Reitoria; algumas gurias bonitas dando a última olhada na matéria antes da aula; uns guris da Engenharia, de calças largas, caras de sono e calculadoras científicas sobre a mesa; e o senhor que traz as garrafinhas de suco de laranja natural. Tomei o cafezinho e saí.
     Eram cerca de sete e meia. Fui saudado e cumprimento pelo o colega que chega junto comigo. No refrigerador guardei o sanduíche que trago de casa e sempre como lá pelas nove horas. Na minha sala liguei os três estabilizadores aos quais estão conectados três computadores e outras parafernálias da informática. Liguei meu computador, digitei a senha e, enquanto o lerdo sistema operacional se espreguiçava pra enfrentar um dia, fui até a janela olhar o movimento na rua.
     O sol saíra de debaixo do cobertor e lançava seus primeiros raios sobre a avenida. Uma fila de veículos ia em direção ao túnel; outras esperavam na avenida. Depois a cena se inverteu. Passou uma ambulância com a sirene ligada, em direção ao Pronto Socorro. Começou cedo.
     Voltei para a mesa. O Windows XP se iniciara e esperava por minhas ordens. A primeira era olhar os emails. Separei o joio do trigo, colhi apenas o trigo importante e comecei o dia de trabalho.
     Às 12 e 30, antes de a carruagem virar abóbora, cliquei em Iniciar e Desligar o computador. Desliguei o monitor e o rádio, levantei, empurrei a cadeira pra baixo da mesa e disse ao meu colega e à estagiária: — Então tá, então! Era a senha pra saberem que estava indo embora.
     Voltei pelo mesmo caminho da ida. Cinco quilômetros depois fui recebido em casa com um beijo da mulher, latidos e festa da Lila e um olhar lânguido e azul da Wanda, que cedinho já se esfregara nas minhas pernas. Senti o cheirinho da comida, que já estava pronta.
     O que aconteceu depois é outra história.
     Assim foi minha manhã de ontem. Poderia ter sido de anteontem ou do mês passado; pode ser uma de amanhã ou de depois de amanhã ou, ainda, de um dia qualquer no futuro. Em algumas o cenário foi e, noutras, será diferente: numa o céu estava nublado; em outra está chovendo, nem consigo olhar pela janela da área de serviço sem receber uns pingos na cara; noutra mais ventará. São minhas manhãs de um dia de semana, que pessimistas e desafortunados chamam de rotina. Agradeço, contudo, pela rotina que me mantém vivo.

segunda-feira, 19 de abril de 2010

2,32 por segundo!




     Copiei a tela do computador às 17h35min56:500seg do dia 19 de abril de 2010. Naquele exato momento, a população da Terra era de 6 bilhões, 821 milhões, 32 mil 659 habitantes. O número de nasci-mentos no último ano, até às 17h35min, como já escrevi, era de 39 milhões, 943 mil 807. Morreram, nesse mesmo período, 16 milhões, 997 mil 695 pessoas. Calcula-se, portanto, que a população mundial cresceu 22 milhões, 946 mil 112 terráqueos.
     Depois de congelar e copiar a tela que fornece esses dados, colei a imagem da memória no Photoshop, de onde tirei os números acima, pois é impossível memorizá-los simplesmente olhando pasar a caravana de algarismos. O passo seguinte foi abrir o editor de textos e começar a escrever. Ainda tomei um copo d'água nesse meio tempo. Agora vou refazer o processo pra ver em quanto aumentou a população da Terra nesse período.
     Pronto. Congelei a tela às 17h35min33seg. Em 20 minutos 36 segundos e meio, a população do nosso planeta aumentou em 2.873 pessoas, ou seja, 2,32 por segundo.
     Você deve estar curioso pra saber de onde tirei esses números. Então eu digo: foi de um site chamado Poodwaddle.com. O relógio do mundo (world clock) traduzido para o português está na URL http://www.poodwaddle.com/clocks2pw.htm.
     Os valores que o relógio registra são aproximações baseadas em estatísticas anteriores e estimativas, e são calculados desde o início do período selecionado. Assim espero, senão estarei pagando um grande mico. Neste caso, escolhi um ano, mas poderia ter selecionado Semestre, Mês, Dia e Agora.
     Esse relógio marca tudo, menos bobeira. Sei que você não vai resistir e acessar o site. Mesmo assim vou dar uma idéia do que ele revela. Além das horas, que me parece óbvio, e além da população mundial, nascimentos, mortes e aumento da população, lá se encontram números sobre doenças não transmissíveis, ferimentos, doenças infecciosas e outros tipos de doenças. Ali estão registrados, sempre com base em estatísticas existentes, o número de abortos no período que vocês escolheu, pontos de acesso à internet, incidência de cãncer, petróleo extraído, espécies extintas e muitas outras coisas. Tudo em números que se vão atualizando incessantemente. Pra não dizer o nome de um famoso programa das noites de domingo, só me resta usar seus sinônimos: é incrível, extraordinário, prodigioso!
     Acesse o poodwaddle.com e salve-o nos seus Favoritos. Um dia você vai precisar desses números, nem que seja pra dizer no seu blog que a cada 10 segundos são feitos 15 abortos no mundo.

sábado, 17 de abril de 2010

A marca como sinônimo de categoria de produto



     Paula mandou seu filho, Daniel, ao supermercado. Pediu-lhe que comprasse um pote de mumu, uma caixa de omo, uma caixa de bandaid e uma de cotonetes. Daniel resmungou qualquer coisa, pegou o dinheiro com a mãe e saiu, meio a contragosto, porque estava na penúltima fase de Final Fantasy XIII, seu mais recente game.
     Menos de meia hora depois estava de volta. Largou a sacola do mercado sobre a mesa da cozinha e, sem nem olhar para a mãe disse, entre dentes, pra ela ver se estava tudo certo. Voltou ao PlayStation sem esperar pela resposta.
     Paula pegou a sacola e começou a esvaziá-la. Tirou um pote de doce de leite “Da Colônia”, uma caixa de sabão em pó “Ariel”, uma caixinha de bandagem adesiva “York” e outra de hastes flexíveis da mesma marca.
     Teria Daniel comprado os produtos errados?
     Acho que não. Paula não reclamou e gritou lá da cozinha: “– Obrigada, meu filho! Era isso mesmo que eu queria”!
     Pode parecer uma historinha estranha, sem pé nem cabeça, mas tem sentido. Usei-a como mote para falar de marcas que se identificam com produtos. Ocorreu-me o assunto ao ver na TV um monge budista gaúcho que está vivendo num mosteiro, no Himalaia. Em determinado momento ele disse que, entre outras coisas, sentia saudades de mu-mu. Titubeou um segundo e completou: “— Doce de leite!”
     Então vejamos. Barbear-se com gilete, tirar uma xerox, usar uma calça de lycra e limpar as orelhas com cotonete são coisas comuns de se fazer ou ouvir dizer no cotidiano. Nem sempre, no entanto, a barba é feita com lâminas Gillette, as fotocópias são obtidas através de uma máquina da Xerox, a calça de fio elastano é da DuPont ou são usadas hastes flexíveis da Johnson&Johnson. Pode-se perfeitamente usar lâminas de barbear Bic; fazer cópias numa máquina Minolta; vestir roupas de elastano de qualquer marca; e limpar as orelhas com palinetes York.
     Quando Paula pediu que Daniel comprasse mumu, referia-se a doce de leite; ao falar omo, queria sabão em pó; bandaid, pra ela e todo mundo, é curativo adesivo; cotonete é haste flexível, normalmente de plástico com tufos de algodão nas duas pontas.
     A explicação pra isso é que muitas marcas se sobressaem e se tornam sinônimos de categoria por terem se antecipado a produtos similares no mercado. Desse modo, tornaram-se referência para os consumidores, cedendo seu nome a uma categoria de produtos.
     Algumas marcas virarem sinônimo de categoria de produto, além de ser uma questão de marketing, é, também, um fenômeno linguístico. Identificar os produtos com o nome de determinada marca tornou-se tão usual que os dicionários já contêm verbetes como Bandaid (Curativo antiséptico autoadesivo), Maisena (Produto industrial constituído por amido de milho, e com que se fazem mingaus, pudins, cremes etc.), Lycra (Tecido sintético, dotado de elasticidade, empregado na confecção de maiôs, biquínis, calças, roupas íntimas etc.), Gilete (Qualquer lâmina descartável de barbear, usada para esse ou outros fins, com ou sem o aparelho que a sustenta em posição própria para ser utilizada), Xerox (Diz-se de ou fotocópia obtida por meio de tal máquina), Cotonete (Haste, geralmente flexível, cujas extremidades são recobertas de algodão, empregada especialmente para fins higiênicos e também para limpar superfícies, cavidades pequenas etc.).
     Pesquisando sobre o assunto na internet encontrei a dúvida de uma internauta num fórum de discussão. Ela perguntava: “— Quero saber como se faz o mumu caseiro, qual a quantidade de leite e açúcar na receita pra dois litros de leite?” Obviamente ela queria saber como fazer “doce de leite” caseiro. A pergunta, porém, suscitou dúvidas em outras internautas. Ambas devolveram a pergunta sobre a receita com outra pergunta. A primeira: “— O que seria ‘mumu’ algum tipo de doce tradicional de qual região? Desculpe a ignorância e a curiosidade”. A segunda: “— Perdão, mas o que é ‘mumu’? Nunca ouvi falar”.
     Mais adiante, um internauta do Tocantins explicava: “Mumu - palavra usada no Rio Grande do Sul pra chamar o doce de leite”.
     Há várias entradas no Google para “Receita de Mumu da Lala (doce de leite)”. Achei bem interessante o título da receita. Lala tinha dúvidas quanto ao nome “mumu” e resolveu explicar que se trata de um “doce de leite”.
     Também existe uma ladainha que corre pelos emails cujo título é “Ser gaúcho é". Lá pelas tantas, diz o texto que ser gaúcho é: “[...] achar que o GUAÍBA é rio; chamar geléia de CHIMIA e doce de leite de MU-MU [...].”
     Apesar de um internauta do Tocantins ter colaborado com a definição de mumu, claro está que se trata de um caso regional de marca que se tornou sinônimo de categoria de produto.
     Há uma relação bem grande de marcas associadas a produtos. As mais conhecidas são:

Aspirina – Comprimido para dor de cabeça;
Band-aid – curativo pronto para uso;
Batata Chips – batata ondulada;
Bic – caneta;
BomBril – palha de aço;
Brahma – cerveja;
Cotonetes – hastes de algodão;
Danone – iogurte;
Durex – fita autocolante;
Gillette – lâmina de barbear;
Leite Moça – leite condensado;
Lycra – tecido de poliamida;
Maizena – amido de milho;
Modess – absormente íntimo feminino;
Nescafé – café solúvel;
Nescau – achocolatado em pó;
OMO – sabão em pó;
Pinho sol – desinfetante;
Q-Boa – água sanitária;
Ray-Ban – óculos escuros;
Teflon – revestimento antiaderente (politetrafluoroetileno);
Xerox – fotocópia;
Zorba – cueca.

     Uma marca ser sinônimo de categoria de produto, no entanto, não é só vantagens. Há cinco anos, a Allergan, fabricante da toxina botulínica tipo A, mais conhecida como Botox, publicou um comunicado de esclarecimento em seis grandes jornais brasileiros sobre os direitos de propriedade intelectual da marca Botox, ameaçando processar quem fizesse mau uso do nome do produto. A empresa alegou que seu produto não é sinônimo para qualquer tratamento de rejuvenescimento que existe na praça.
     Embora seja marca registrada da empresa, o nome Botox estaria sendo usado para designar um sem número de tratamentos estéticos, que vão de cremes anti-idade a aplicações feitas em salões e clínicas de fundos de quintal. Anúncios apregoavam as maravilhas de cosméticos “botox like”, “botox em creme”, “botox sem agulha” ou ainda “better than botox” para efeitos de rejuvenescimento facial. (Fonte: O Estado de S Paulo - Empresas & Tecnologia - Pág B9 - 04.04.05).
     Outro fenômeno interessante envolvendo nomes ou marcas, mas que não funciona exatamente como sinônimo de categoria de produto são os neologismos baseados em coisas do cotidiano, especialmente relacionados à informática e internet. Já existe, por exemplo, o verbo “googlar” (ou guglar), que significa fazer uma pesquisa na internet utilizando o motor de busca Google. A Google, no entanto, não incentiva o uso de palavras relacionadas à sua marca registrada. A empresa receia um possível desgaste da marca, como considera ter ocorrido com Xerox, Gillette, etc.

     Talvez o objeto da relação que vou fazer agora já esteja esquecido pelo povo quando chegar a época de Natal, mas se poderá dizer que quem for comprar Panetones vai “arrudar”...

quinta-feira, 8 de abril de 2010

Presunto picante



     Recebo diariamente uma quantidade significati-va de spams. Spam é a abreviação em inglês de spiced ham (presunto picante). Trata-se do envio, a uma grande quantidade de pessoas de uma vez, de mensagens eletrônicas, geralmente com cunho publicitário, mas não exclusivamente. Geralmente os spams têm caráter apelativo e, na grande maioria das vezes, são incômodos e inconvenientes.
     Até pouco tempo, a maior parte dos spams vinha em inglês. Agora já vêm traduzidos. Recebo às pencas anúncios de relógios Rolex, shampoos que fazem crescer cabelo, Cialis e Viagra — que fazem crescer outra coisa —, manuais para fazer crescer essa outra coisa (até 12cm!)... Enfim, uma infinidade de inutilidades. Mas, se eles existem e são enviados, é porque tem quem acredite ou compre.
     Também têm os spams de gente pedindo ajuda pra filha com doença incurável, de flanelinha que joga ácido no vidro do carro, de novos tipos de assalto, etc. Além desses, há os de cunho político, que me são enviados por “amigos”, ou seja, pessoas que conheço e que fazem parte do meu catálogo de endereços.
     Algumas mensagens me intrigam e fico sem entender como é que mantenho o remetente na minha lista. Refiro-me àquelas mensagens sobre o cara que, apesar de ter mais de 80% de popularidade, é extremamente criticado, espezinhado, desprezado, desdenhado e outros “ados” prejudiciais.
     O cara em questão é “o cara” mesmo. Seguidamente, recebo spams criticando, espezinhando, desprezando, desdenhando — e outros “andos” — o presidente Lula ou seus familiares ou os que o cercam. Por óbvio meus correspondentes não são os autores dos textos. Recebem de outros e, por gostarem do canto do galo mesmo sem saber onde ele canta, encaminham, formando, assim, uma corrente de difamação.
     Encaminhar esse tipo de mensagem só pode ser desdém. Parece que estou vendo aquelas vizinhas gordas, feias e moralistas falando mal da vizinha bonita e gostosa que, por isso, mesmo sem prova alguma, é malfalada. A internet facilita esse tipo de fofoca, de falta de ética e de irresponsabilidade. O que mais me impressiona é que eu acreditava que meus correspondentes fossem pessoas inteligentes, capazes de desconfiar, avaliar e separar o joio do trigo. Nem se dão o trabalho, no entanto, de pesquisar no Google pra ver se a “notícia” que estão repassando é verdadeira ou é coisa de vizinha invejosa.
     Nos últimos dias recebi dois spams desses. O primeiro veio com o assunto “GENTALHA - vejam: tal pai tal filho”. O texto dava conta de uma cena supostamente “protagonizada pelo filho do filho do Brasil”, Luís Cláudio Lula da Silva, filho mais moço do presidente. Dizia que ele, “exaltado e bêbado, teve que ser retirado pelos seguranças do Cirque du Soleil, porque ele acredita ser o dono de tudo [...]”. A “matéria” dizia que o filho de Lula, acompanhado de duas garotas, tentara sentar no lugar de três senhoras, num espetáculo do Cirque de Soleil. Pra isso, teria usado suas credenciais de filho do presidente. Ao ser interpelado pela segurança, teria dito aos berros, entre outras coisas: “Você sabe com quem está falando? Também, posso fazer você perder seu emprego”.
     O texto não para por aí: o redator dá um monte de adjetivos — nada próprios para uma crível matéria jornalística — a Lula e à família Silva. Não diz sequer onde teria acontecido o fato. Começa assim: “Em uma viagem tomei conhecimento sobre um episódio deprimente, ocorrido durante uma apresentação do Cirque du Soleil. Foi relatado por um dos organizadores”. E vem o resto do texto cheio de adjetivos desqualificativos.
     Analisemos, então. Que jornal publicaria um texto que começasse com“em uma viagem tomei conhecimento...”. Quem estava viajando seria o jornalista que escreveu a matéria? Para onde ia, onde estava e quem seria o organizador do Cirque?
     Uma das regras básica do jornalismo diz que uma matéria deve tentar responder às seguintes perguntas: O quê? Quem? Quando? Como? Onde? Por quê? (não necessariamente nessa ordem). Além disso, todos os “quens” envolvidos devem ser ouvidos e as fontes citadas.
     O spam sobre o filho de Lula não está assinado, não cita fonte alguma, não diz onde (cidade/estado) ocorreu o suposto fato, o nome do representante do circo, etc.
     A única verdade da “fofoca” é que Luís Cláudio Lula da Silva é o filho mais moço de Lula. A propósito: tem 24 anos e é auxiliar de preparação física do Corinthians.
     Para ler o babado completo, digite no Google o seguinte: luiz cláudio lula da silva cirque du soleil (mas não acredite no que ler). Vão aparecer aproximadamente 2.660.000 resultados. Nenhum, no entanto, de algum site de empresa jornalística considerável, tipo O Globo, Jornal do Brasil, Estado de São Paulo, Isto É, Época, etc. Será que a Veja não iria deitar e rolar num caso desses?

.:: o ::.

     Outro spam que recebi na mesma semana se refere a uma matéria publicada não sei onde e nem por quem em 25 de setembro de 2009. “Presidente Lula define prêmio para jogadores que venceram a Copa do Mundo; valor pode chegar a 465 mil reais”. Eis a matéria:

O presidente Lula e a Associação dos Campeões Mundiais do Brasil negociam aposentadoria e indenização para os atletas da seleção que ganharam Copas do Mundo. O benefício valerá inicialmente aos ex-jogadores de 1958 e se estenderá, posteriormente, a quem atuou nos Mundiais de 1962, 1970, 1994 e 2002. Reunião na Casa Civil discutiu as cifras a serem pagas aos campeões. Inicialmente, o valor negociado para cada um gira em torno de mil salários mínimos, no caso da indenização (465 mil* reais), e de dez salários mínimos (4.650* reais), o teto da Previdência, para a aposentadoria. A expectativa é que o anúncio da nova medida seja feito pelo governo na próxima semana.(*o valor do salário mínimo não está reajustado para 2010)

     Começo a analisar esse texto pelos termos contraditórios que usa.
     O que é prêmio? É um bem material ou moral recebido por um serviço prestado, por um trabalho executado, ou por méritos especiais; uma recompensa conferida a quem se distingue em competição, jogo ou concurso.
     Até aqui tudo bem. E o que seria indenização? O termo indenização refere-se à compensação devida a alguém de maneira a anular ou reduzir um dano, geralmente, de natureza moral ou material, originado por incumprimento total, ou cumprimento deficiente de uma obrigação, ou através da violação de um direito absoluto.
     Aposentadoria, por sua vez, é a concessão, reforma ou dispensa de serviço com soldo ou ordenado por inteiro, ou parte dele.
     Seria prêmio, indenização ou aposentadoria? Prêmio seria o certo. Uma indenização é totalmente descabida nesse caso, uma vez que não houve qualquer incumprimento, cumprimento deficiente ou violação de um direito absoluto. Não há, também, dano algum a reparar. Sobre aposentadoria, então, sem comentários.
     Como se uma barrigada só não bastasse, o texto traz um suposto comentário de Tostão, ex-campeão do mundo, comentarista esportivo, escritor e médico, que teria sido publicado em vários jornais do Brasil. Nele, Tostão pede para que seu nome seja retirado da lista de beneficiados por considerar que não há razão para prêmio, indenização ou aposentadoria.
     Fui atrás da matéria que resultou no comentário de Tostão e só encontrei referências ao hipotético ato presidencial em blogs. Provavelmente os blogueiros que o publicaram também tenham recebido o mesmo e-mail, mas não foram conferir a veracidade. O comentário de Tostão, por sua vez, foi publicado em todas as colunas que assina e em vários blogs de terceiros. Vai ver ele ficou “sabendo” da “notícia” através do spam que recebeu por e-mail, assim como eu. Se realmente for uma invenção de mau gosto, Tostão pagou o maior mico eletrônico. Se for verdade, pago eu...

.:: o ::.

     Concluo que há que se criar e implementar urgentemente uma lei para a internet, em que sejam penalizados os criadores de tais absurdos, com extensão aos repassadores das infâmias. Como ainda não há algo assim, espero que os leitores que por acaso praticam o ato de repassar spams sem conferir a veracidade da informação se sintam envergonhados ao lerem o que aqui está posto.