Coisas que me dão na telha, de vez em quando, e que quero deixar registradas, nem que seja num blog.







terça-feira, 20 de outubro de 2009

O diploma de jornalista


     No artigo "Diploma de jornalista: uma questão já decidida" (Correio do Povo, 20/10/2009), Judith Brito, presidente da Associação Nacional de Jornais (ANJ), condena a tramitação, no Congresso, de duas propostas para incluir na Constituição a exigência de diploma para o exercício da profissão de jornalista. Cabe lembrar que, em recente decisão, o Supremo Tribunal Federal (STF) considerou inconstitucional a exigência do diploma universitário de jornalista para o exercício da profissão.
     Dona Judith é formada em Administração Pública pela Fundação Getúlio Vargas, com mestrado em Ciência Política na PUC, portanto, não tem diploma de jornalista, mas trabalha há quinze anos no Grupo Folha.
     Diz a administradora que "as empresas jornalísticas continuarão a contratar a imensa maioria dos seus profissionais entre egressos dos cursos de Jornalismo. [...] ele (o jornal) é o maior interessado em ter os melhores profissionais". E continua, dizendo que a decisão do STF "foi uma definição em favor do direito fundamental da liberdade de expressão, uma das "cláusulas pétreas" da Constituição (que não podem ser mudadas em nenhuma hipótese)".
     Ora, talvez a dona Judith não tenha entendido o que quiseram deixar registrado os legisladores sobre liberdade de expressão nos artigos 5º e 220 da Constituição. Então lá vai:

"Art. 5°, IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;
Art. 5°, IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;
Art. 5°, XIV - é assegurado a todos o acesso à informação e resguardo do sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional;
Art. 220 - A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo, não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.
§1° - Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5°, IV, V, X, XIII e XIV;
§2° - É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística."

     Então eu pergunto: o que tem a ver liberdade de expressão com o fim da exigência do diploma de jornalista para o exercício da profissão? Nada! É puro sofisma da dona Judith e de tantos outros envolvidos com a ideologia jornalística dominante (putz, que jargãozinho esquerdista!). A não ser que ela e os outros — inclusive os ministros do STF — estejam se baseando na expressão "não sofrerão qualquer restrição", encontrada no Art. 220 da Carta Magna. O que os legisladores pretenderam com os artigos 5º e 220 foi prevenir a censura prévia por parte do poder público. A censura, no entanto, está dentro dos próprios veículos.
     De acordo com Edilsom Farias*, "a liberdade de expressão e informação compreende a faculdade de expressar livremente ideias, pensamentos e opiniões, bem como o direito de comunicar e receber informações verdadeiras sobre fatos, sem impedimentos nem discriminações. O objeto da liberdade de expressão compreende os pensamentos, ideias e as opiniões, enquanto que o direito à informação abrange a faculdade de comunicar e receber livremente informações sobre fatos, ou seja, sobre fatos que podem ser considerados noticiáveis".
     Liberdade de expressão e direito à informação, portanto, tem a ver com informação "verdadeira" e "correta"; exigência ou não de diploma se refere á relações trabalhistas, ou seja, só se contrata quem tem a mesma opinião do veículo em que se vai exercer a profissão.
     Nunca acreditei muito que seja necessário um diploma pra se ser jornalista. A informação já existia, os jornais já existiam, os profissionais já se expressavem livremente (on não!) há muito tempo quando surgiram os cursos de jornalismo. Estes vieram suprir uma deficiência acadêmica para o exercício da profissão, bem como para regular uma fatia do mercado de trabalho. Tanto é que, quando começou a ser exigido o diploma, os que não o tinham continuaram trabalhando normalmente — e muitos ainda exercem a profissão —, sem "sofrer qualquer restrição".
     Ainda sobre o artigo de dona Judith: alega a mestre em Ciência Política que a Constituição é um documento de principios filosóficos e que, portanto, não caberia impor-lhe um tema tão específico. Concordo, mas se os princípios da Carta são filosóficos, pra que recorrer da exigência de diploma para o exercício da profissão de jornalista? Aí tem...
     Prefiro ficar com o pensamento de outra mulher, Beth Costa, presidente da Federação Nacional dos Jornalistas, que pode ser encontrado aqui.

*Edilsom Farias - mestre em Direito Constitucional pela Universidade de Brasília (UnB), doutorando em Direito Constitucional pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), professor da Universidade Estadual do Piauí (UESPI) e Promotor de Justiça.
FARIAS, Edilson. Democracia, censura e liberdade de expressão e informação na Constituição Federal de 1988.
Disponível em http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2195. Acesso em 20/10/2009.

Um comentário:

Clara disse...

"Abaixo a dona Judith!!"
Beijo jornalístico e diplomado!