Coisas que me dão na telha, de vez em quando, e que quero deixar registradas, nem que seja num blog.







sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

O cara disse: merda!


Eu não quero saber se o João Castelo é do PSDB, eu não quero saber se o outro é do PFL, eu não quero saber se é do PT. Eu quero saber se o povo está na merda e eu quero tirar o povo da merda em que ele se encontra. Esse é o dado concreto.
Luiz Inácio "o cara" da Silva


     Que merda! O Lula falou merda! O presidente falou merda! Não me entenda mal: ele não falou merda, ele disse merda, ou melhor, também não disse... Tá difícil de entender? Pois é... Que merda! Vou tentar me fazer entender: o Lula pronunciou a palavra merda. Ufa! Consegui!
     Viram como é difícil falar merda, ou melhor, falar "em" merda. Afinal, o que é e o que significa merda?
     É muito relativo. Depende sobre o que se está falando, de quem se fala, como se fala, onde, etc. A palavra em questão é um substantivo feminino que significa, em sua primeira acepção, matérias fecais, excremento, dejeto. Por extensão de sentido, merda também é acúmulo de lixo, de sujeira, imundícia, porcaria, sujidade. Em linguística, o uso do vocábulo merda é um tabuísmo. Mas que merda é esta?
     Tabuísmo (tabu + -ismo), substantivo masculino, é uma palavra, locução ou acepção tabus, consideradas chulas, grosseiras ou ofensivas demais na maioria dos contextos. São os chamados "palavrões" e referem-se, geralmente, ao metabolismo (cagar, mijar, merda), aos órgãos e funções sexuais (caralho, pica, boceta, colhão, foder, etc.), incluem ainda disfemismos pesados como puta, veado, expressões tabuizadas (puta que pariu) etc. Já sei, você não sabe o que é disfemismo. É uma expressão grosseira ou desagradavelmente direta, em vez de outra, indireta ou neutra. Entendeu?
     Para explicar tabuísmo deve-se, ainda, explicar tabu e ismo. Tabu vem do polinésio tabu e significa sagrado, intocável, proibido. Tabu, substantivo masculino, é uma proibição convencional imposta por tradição ou costume a certos atos, modos de vestir, temas, palavras, etc., tidos como impuros, e que não pode ser violada, sob pena de reprovação e perseguição social. Trata-se de uma interdição cultural e/ou religiosa quanto a determinado uso, comportamento, gesto ou quanto à linguagem.
     Por sua vez, ismo é um sufixo nominal (formador de nomes): doutrina, escola, teoria ou princípio artístico, filosófico, político ou religioso'; 'ato, prática ou resultado de'; 'peculiaridade de'; 'ação, conduta, hábito, ou qualidade característica de'; 'afecção', 'quadro mórbido', 'condição patológica (causada por)'; 'conjunto das características comuns a certo povo, ou civilização'; 'expressão, ou palavra própria de determinada língua, ou região, ou povo'; 'proteção, patronato'; 'modalidade ou prática esportiva'.
     O uso da palavra merda poderia também ser classificado como um plebeísmo: modos, usos, frases, palavras, de uso exclusivo da plebe.
     Mais uma coisinha: os meios de comunicação, em geral, disseram que Lula disse um "palavrão". O termo tanto pode significar uma palavra grande e difícil de pronunciar como uma palavra obscena ou grosseira; palavrada, pachouchada ou, ainda, termo enfático ou empolado; palavrada.
     Tudo que está dito acima, com exceção dos dois primeiros parágrafos, está nos dicionários. Podem conferir.
     Em questões de linguística, de lexicografia, de terminologia, estamos conversados. Mas em questões políticas? O que significa merda num discurso político?
     Pois é. O Lula pronunciou um palavrão: merda! Que merda! Significa que deu mais um motivo para os tabuístas de plantão se manifestarem. Só isso. O que será que aconteceria se Berlusconi dissesse "schifezza"? E o Obama, dizendo "shit" ou "crap" num discurso? A Angela Merkel falaria em "mist"? Na língua do Sarcosy ficaria mais parecido: "merde".
     Mudando de saco pra mala, no mesmo dia li nos mesmos (alguns) meios de comunicação que noticiaram a merda do Lula as seguintes notícias:

Eleito um dos 100 personagens do ano pelo jornal espanhol "El País", o presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi tema de um artigo assinado pelo primeiro-ministro espanhol, José Luis Rodríguez Zapatero, com o título "O homem que surpreende o mundo". No texto, Zapatero diz que sente "profunda admiração" por Lula e faz diversos elogios ao colega brasileiro (http://www.elpais.com/articulo/internacional/hombre/asombra/mundo/elpepuint/20091211elpepuint_1/Tes).

Aprovação de Lula cresce na pesquisa CNI/Ibope. 72% dos brasileiros avaliam o governo como bom ou ótimo. 83% aprovam a maneira como o presidente Lula dirige o país.

Avaliação positiva do presidente Lula sobe para 78,9%, diz CNT/Sensus. No último levantamento, em setembro, índice era de 76,8%. Aprovação do governo federal sobe de 65,4% para 70%.

     E olha só o que "o cara" disse:

"Lógico que eu falei um palavrão aqui. Amanhã os comentaristas dos grandes jornais vão dizer que o Lula falou um palavrão. Mas eu tenho consciência de que eles falam mais palavrão do que eu todo dia e tenho consciência de como é que vive o povo pobre desse país e é por isso queremos mudar a história desse país".

     O que será que ele quis dizer com "eles falam mais palavrão do que eu todo dia"? Que falam merda diariamente?

Um comentário:

Clara disse...

Beleza de comentário e explicações.
Só sei que eu gosto desse "cara", do que falou merda e de quem escreveu...