Coisas que me dão na telha, de vez em quando, e que quero deixar registradas, nem que seja num blog.







quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

O especialista


     Agora sim! Chega de café de chaleira! A propósito: você, leitor, sabe o que quer dizer “chega de café de chaleira”? Antes há que se explicar o que é “café de chaleira”. Pois bem, no tempo em que os gaúchos não eram esses personagens caricatos pintados pelos programas humorísticos feitos por paulistas e cariocas, viajavam durante a madrugada levando gado de uma localidade pra outra. De manhãzinha, acampavam e preparavam um café para, depois, seguirem viagem. O café era feito da seguinte forma: quando fervia a água, a chicolateira (chaleira) era retirada do fogo e nela eram colocadas duas ou três colheres bem cheias de café em pó. Com a própria colher ou com a ponta de um facão, aquela mistura era bem mexida, até dissolver-se o máximo possível. Em seguida, a chaleira era colocada novamente no fogo, até ferver outra vez, deixando transbordar o líquido. Era, então, outra vez retirada do fogo e dentro dela era colocado um tição aceso, provocando nova ebulição. Depois de alguns segundos, o preparador dava umas pancadinhas com o cabo do facão na chaleira, fazendo com que a borra ficasse no fundo. Estava pronto o café.
     Muito tempo depois, surgiu o café solúvel e, com ele, a expressão “chega de café de chaleira”, imortalizada pelo grande folclorista Paixão Cortes em comerciais de TV. Muito mais se poderia falar sobre esse fato, que rendeu muito pano pra manga, mas o que interessa é explicar que a expressão significa pouco mais do que a primeira palavra dela, ou seja, chega, basta. Pouco mais do que um simples “basta” porque dá a entender que há outro modo mais fácil de se chegar a um objetivo, sem muito trabalho.
     Vamos ao ponto: essa conversa introdutória, demorada como um, digamos, café de chaleira, é pra dizer que agora sou especialista em Estudos Linguísticos do Texto. Nossa! Mas, então, continua o “café de chaleira”, porque devo tentar pelo menos fazê-los entender o que é “linguística”.
     Pode-se dizer que linguística é o estudo científico da linguagem, ou seja, que é a ciência responsável pelo estudo do fenômeno da linguagem ou, ainda, que é simplesmente o estudo do uso da linguagem. Por favor, não confunda com gramática, que é a responsável pelas “normas” que norteiam a linguagem. A linguística estuda como a linguagem se forma, sua origem e sua função.
     Agora sim, vou contar desde o início.
     Trabalho numa universidade pública federal. Sou, portanto, servidor público federal, que ganha pouco, mas se diverte e ainda tem alguns benefícios. Um deles é o Programa de Qualificação, através do qual é possível melhorar um pouco o minguado salário ao concluir, no meu caso, um curso de pós-graduação numa área afim com a graduação. Faz-se um curso de especialização e sobe-se um degrau na carreira; depois de cinco anos, mestrado, mais um degrau; cinco anos depois, doutorado, mais um degrau. Concluí em agosto e finalmente ficou pronto o meu certificado do Curso de Pós-Graduação Lato Sensu: Especialização em Estudos Linguísticos do Texto.
     Mas o que tem a ver o café de chaleira e o chega dele com isso tudo? Simples. É como se eu chegasse ao meu empregador e dissesse pra ele: tá aqui a minha qualificação, agora vais ter que aumentar meu salário.
     Essa história começou em abril de 2008, quando fui incentivado por uma colega a fazer um curso que começaria no mês seguinte. Me informei e só tinha um disponível na minha área, que era o de linguística, duração de um ano, 360 horas, só aos sábados, manhã e tarde... Putz! A primeira coisa que fiz foi procurar saber o que era linguística pra tentar entender o programa do curso. Fiquei como você deve ter ficado ao ler a minha tentativa de explicação parágrafos acima: Huuuummmm... então tá! Mas vamos lá, um ano passa rápido pra quem já viveu mais de meio século. Comecei a gostar quando descobri que, por ser funcionário da instituição que ministrava o curso não precisaria pagar. Ah! — pensei — este curso deve ser ótimo! Pelo menos melhor do que injeção na testa.
     Afinal chegou o dia. Minha última participação em cenas acadêmicas como estudante ocorrera em dezembro 1978, quando me graduei em jornalismo. O que viria pela frente? Estudar de novo, aos sábados, até as cinco da tarde. Senti-me um tanto desconfortável sentado na primeira fila, de costas pra um monte de jovens de ambos os sexos recém-formados em Letras, pra algumas jornalistas e um outro jornalista, pra professoras de gramática, tradutores e revisores. Mais estranho ainda foi fazer a própria apresentação e ter que confessar perante todos que há 30 anos não sentava num banco escolar. Os mais práticos, com certeza, calcularam minha idade, mas duvido que tenham acertado.
     Enfim, as coisas foram acontecendo como tinham que acontecer. Logo me enturmei e virei cúmplice dos colegas. Estávamos todos no mesmo barco, remando contra a maré, rumando não se sabe pra qual ilha, rimando conhecimento com crescimento, atravessado disciplinas com disciplina.
     Como eu imaginava, os sábados logo se acabaram. Em agosto de 2009 apresentei meu trabalho de conclusão perante a banca e cá estou hoje, com o salário um pouco menos minguado, um baita conhecimento sobre a tal de linguística e um belo certificado na gaveta. Não posso deixar de agradecer aos professores (por ordem programática) Valdir do Nascimento Flores, Carmem Luci da Costa Silva, Maria José Bocorny Finatto, Cristina Uflacker, Margarete Schlatter, Magali Endruweit e Marlene Teixeira.
     Olha aí o certificado.


2 comentários:

mulher de sardas disse...

ahhh! preciso ver o meu de perto!!

vidacuriosa disse...

Esse é meu colega Aldo. Sucesso, paz e alegria.